quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Hoje é um dia triste,
está chovendo,
o sol não brilha
ninguém sorri.

Crie na sua alma a mulher envolvente.

O poeta é fingidor.


O poeta é um fingidor.

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.


E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.


E assim nas calhas de roda Gira,

a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.


Fernando Pessoa

domingo, 9 de dezembro de 2007

Soneto de Natal


Um homem, — era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço no Nazareno, —
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,

Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensações da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.

Escolheu o soneto... A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.

E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"

(Machado de Assis)